(Trabalho de conclusão do curso de Acupuntura Japonesa na Multiversidade)

1. INTRODUÇÃO

Pela definição descrita no Wikipedia, crença “é o estado psicológico em que um indivíduo detém uma proposição ou premissa para a verdade, ou ainda, uma opinião formada ou convicção.” A definição do livro ThetaHealing complementa o conceito: “a aceitação por parte da mente de que algo é verdadeiro ou real muitas vezes é sustentada por um sentido emocional ou espiritual de certeza.”

As crenças, que podem ser conscientes ou inconscientes, são formadas ao longo da nossa vivência e experiência pessoal, incluindo infância e adolescência, e também estão muito correlacionadas com o ambiente familiar, geográfico e sociocultural no qual estamos inseridos.

Neste sentido, ao estarmos inseridos numa sociedade urbana ocidental, muitas crenças entram em choque quando executamos uma prática oriental milenar, cujo padrão mental diferencia-se profundamente da anterior. Duas questões interessantes do ocidente de serem exploradas para ilustrar essas diferenças são (i) a dominância do método científico através da ciência denominada Medicina quando se trata do assunto saúde e (ii) a baixa legitimidade atribuída às atividades que envolvam o uso do poder intuitivo humano bem como das atividades sutís que lidam com nossa energia vital. Dado isso, a presença de um corpo energético em nosso organismo vem sendo recorrentemente ignorado dentro dos conceitos ocidentais de saúde.

A cura de doenças, portanto, vem sendo associada no ocidente com o uso de medicamentos e/ou procedimentos cirúrgicos, levando as pessoas a

desenvolverem as crenças de que estes são os únicos caminhos para a cura, em especial de doenças graves ou de dores agudas. Além disso, a Medicina,

construída ao longo dos anos de forma altamente complexa, foi ganhando um status de autoridade incontestável. Os procedimentos complexos se tornaram mais valorizados que os simples, portanto, a acupuntura, com sua simplicidade de aplicação, é olhada ainda com muita desconfiança e descrença quanto a sua eficácia. Afinal, por esta mentalidade, se a medicina, com todo seu status, complexidade, dinheiro e tecnologia envolvidos, não resolveu um problema, por que só meia dúzia de agulhinhas resolveriam?

Este trabalho visa, portanto, através da exposição de três breves casos presenciados pela autora, expor e explorar a persistente desconfiança quanto à eficácia das terapias com acupuntura, inclusive entre as pessoas que optam por receber tratamentos através deste método. Tal falta de confiança dá origem a situações de grande surpresa (muitas vezes cômicas) nas quais os pacientes entram em conflito interno (“nó na cabeça” ou “choque de crenças”) quando percebem que o sintoma desapareceu após receber acupuntura.

Optou-se por casos de dores agudas, considerando que, nestas situações, o sintoma é muito mais evidente (ao invés, por exemplo, de um desequilíbrio hormonal) e pode desaparecer imediatamente após o tratamento, o que fortalece o “choque”.

Os nomes dos dois primeiros casos foram omitidos para preservar a identidade dos pacientes.

2. REFLEXÕES SOCIOCULTURAIS

Antes de prosseguir com a exposição dos casos, cabe realizar algumas reflexões acerca das duas questões abordadas acima referentes a certas características socioculturais do ocidente.

Primeiramente, é notável o quanto a sociedade ocidental valoriza a tecnologia, o dinheiro e os títulos, não à toa estamos sempre buscando o smartphone de última geração, o aumento do nosso poder de consumo (que pode ser realizado através do dinheiro) e uma marca ou um título que nos faça sentir especiais e/ou nos conceda um senso autoridade/poder. Nesse sentido, a Medicina, construída com tanta tecnologia, dinheiro e milhões de horas de trabalho e pesquisa por parte de profissionais muitas vezes entitulados como mestres e doutores, possui, por tabela, um enorme status de autoridade frente às atividades aparentemente mais simples e sem tanta “parafernália” envolvida.

Nota-se também um apego excessivo às bases do método científico de racionalidade, causalidade, mensuração e comprovação, o que leva a valorizarmos mais os procedimentos cujos funcionamentos podem ser explicados de forma causal, estruturada e racional (ou seja, responder à pergunta de “como funciona?”). A acupuntura, por mais que possua sua eficácia comprovada empiricamente, nunca conseguiu ser explicada racionalmente, isto é, ao cruzar os dados dos sintomas dos pacientes antes e depois do tratamento, os métodos estatísticos provam que a acupuntura funciona para alguns sintomas, no entanto, a medicina nunca conseguiu localizar os meridianos no corpo físico do mesmo modo que ela localiza vasos sanguíneos, órgãos e células, por exemplo. Este “não saber explicar a causa” tende a ser um dos principais motivos desse sentimento de “nó na cabeça” quando uma dor aguda desaparece quase como num passe de mágica.

Uma outra abordagem interessante de ser explorada seria pelos conflitos dualísticos entre matéria versus energia, razão versus intuição: a sociedade ocidental tende a valorizar mais aquilo que é material, palpável, visível e racionalizável e a Medicina se estrutura dessa forma, diferentemente da acupuntura que lida com um corpo energético imaterial e invisível, sendo sua prática um tanto quanto intuitiva e pouco racionalizável. Neste sentido, o choque de crenças tende a ocorrer quando um sintoma desaparece pois, se não conseguimos explicar, nem ver, nem tocar, então parece mágica. Vale reforçar ainda o viés negativo com que essa ideia de “mágica” é encarada em nossa sociedade já que (i) ou olha-se com extremo ceticismo pelo fato de que não é possível explicar racionalmente (ii) ou com uma conotação fortemente pejorativa (afinal, associa-se magia somente a bruxa, vodu/magia negra e poltergeist). Se, ao invés disso, essa “mágica” fosse associada somente àquilo que naturalmente ainda não pode ser explicado racionalmente, talvez como um mistério tão obscuro quanto a pergunta indecifrável da ciência sobre “se o Universo surgiu com uma grande explosão, então o que veio antes desse Big Bang?”, então talvez este choque de crenças não seria tão forte.

3. ESTUDOS DE CASO

CASO 1 – Tratamento de cólica menstrual

Paciente 1, 33 anos, sofre de cólicas menstruais há 20 anos. Estava comigo em minha residência quando começou a relatar dores abdominais relacionadas a cólicas menstruais. Sua primeira reação foi pedir um remédio. Sugeri que se deitasse e experimentasse um breve tratamento de acupuntura ali mesmo e ela aceitou. Ela relata o choque de crença quando a cólica parou: “aceitei o tratamento, mas já com aquele pensamento na cabeça de que ‘caramba, eu tenho cólica há 20 anos e nunca consigo resolver com nada que não seja remédio, então não vão ser essas agulhas que vão resolver’. De repente, quando percebi, a cólica havia acabado”.

É um caso onde entende-se que uma substância química presente em um medicamento possui mais autoridade na cura do que um método cujo funcionamento permanece um mistério para a medicina ocidental. Além disso, a convivência de décadas com uma determinada disfunção cria uma associação de normalidade e, possivelmente, até um vínculo emocional, onde a pessoa já espera que vai acontecer, ou seja, seria como se as cólicas já fossem algo inerente à pessoa e que ela acabou aprendendo a conviver de forma paliativa (ingestão de medicamentos). Isto é, cria-se a crença de que, se não ela conseguiu solucionar o sintoma ao longo dos últimos 20 anos, não será agora que vai conseguir, o que aprofunda o choque de crença.

CASO 2 – Dores no joelho

Paciente 2, estudante de acupuntura. Há alguns anos apresenta dores agudas no joelho, na região do menisco. Realizou intervenção cirúrgica, mas mesmo assim as dores permaneceram. Após alguns tratamentos recebidos ao longo do curso de acupuntura, as dores desapareceram. Havia uma certa resistência e descrença inicial de realizar procedimentos de acupuntura especificamente para as dores no joelho. Uma das crenças era que, se nem uma cirurgia resolveu, não seriam algumas agulhinhas que solucionariam suas dores. No dia em que as dores sumiram, a paciente ficou por diversos minutos mexendo a perna ainda procurando dor como se não acreditasse que ela havia desaparecido.

O choque de crença neste caso está mais relacionado ao nível de complexidade do tratamento. Ou seja, se uma intervenção cirúrgica de alta complexidade não solucionou o seu caso, não teria porque algo simples resolver. É um caso de associação do nível de complexidade de um procedimento ao seu grau de eficácia. Se refletirmos rapidamente sobre o assunto, não é possível encontrar sentido lógico para que essa associação ocorra, no entanto, ela ocorre mesmo assim. Uma hipótese possível é que ela aconteça justamente devido à valorização da complexidade do raciocínio frente à simplicidade da intuição, incorrendo em uma tendência de supervalorizar sempre tudo que é complexo em detrimento do que é simples. Como é um julgamento de valor – isto é, a taxação de que algo é “bom ou ruim” / ”melhor ou pior” – isso teria, então, um impacto direto na expectativa quanto ao nível de eficácia do tratamento.

CASO 3 – Inflamação no tendão do tornozelo

Este foi um caso que aconteceu comigo. Cheguei na aula de acupuntura relatando que estava triste por haver inflamado um tendão próximo ao tornozelo direito. Toda vez que eu esticava o pé, sentia um “puxão” desagradável. Na última vez que eu havia inflamado um tendão, alguns meses antes de começar a estudar acupuntura, recorri aos tratamentos da medicina tradicional e fui a um ortopedista. Após ressonância magnética, 2 meses de imobilização, uso de antiinflamatórios, centenas de reais em consultas médicas e algumas sessões de fisioterapia, meu tendão do pulso voltou ao normal. Acrença que se estabeleceu é que curar inflamação no tendão leva tempo e dá muito trabalho.

Portanto, quando o professor sugeriu colocar duas agulhas para solucionar a dor, eu aceitei, mas já cheia de descrédito, afinal, eu estava sentindo o tendão inflamado. O tendão é uma estrutura física e, na minha cabeça, se aquela estrutura havia sido abalada, não seriam duas agulhas que resolveriam. Como a dor era na região do meridiano do Rim, foi realizado um tratamento no canal do Rim, agulhando apenas duas agulhas ensinadas durante o curso. Quinze minutos depois, o professor pediu para que eu verificasse a dor e eu movi o pé com a certeza de que a dor ainda estava lá, mas, para minha surpresa, a dor havia cessado completamente.

Além de mostrar uma forte similaridade com as crenças relatadas no Caso 2, esta também é uma situação de apego ao conceito de matéria versus energia, onde entendeu-se que uma estrutura física e material foi abalada e, portanto, não seria possível ser curada com um procedimento de base energética. Como se energia e matéria não tivessem nenhum tipo de correspondência, algo que a própria Física já superou através da Teoria da Relatividade e do aprofundamento dos estudos da Mecânica Quântica, no entanto, a psique humana cisma em manter sua identificação com este nível material da realidade.

4. CONCLUSÃO

O uso da acupuntura para tratamento de doenças, inclusive dores e inflamações, ainda é levado com muita desconfiança. O paciente normalmente recorre à acupuntura com a expectativa de que ela seja, no máximo, um atenuante, mas raramente a cura em si. A mentalidade que o paciente chega é normalmente: “Não tenho nada a perder, então vou tentar. Se ajudar, ótimo, caso contrário, tomo um medicamento (ou outro tipo de tratamento convencional da medicina ocidental)”.

No entanto, quando o paciente se depara com a instantânea cessação de seu sintoma (no caso do presente trabalho, as dores agudas), ele se comporta de forma a parecer não acreditar no que aconteceu, o que aqui tratamos por “choque de crença”. Como citado anteriormente, estes choques tendem a se relacionar com os valores mais disseminados no ocidente de matéria e racionalidade e que entram em conflito com as qualidades básicas de uma atividade como a acupuntura que supostamente lida com um corpo energético ignorado na sociedade ocidental, além de ser uma prática simples e intuitiva.

Estas qualidades encontram-se também em nossa psique, seja de forma consciente ou inconsciente, e influencia o nosso comportamento e as expectativas traçadas diante da eficácia dos tratamentos realizados. No entanto, o que taxamos como simples é frequentemente muito mais complexo do que aquilo que julgamos complexo. Afinal, por trás daquelas agulhinhas encontra-se um complexo emaranhado de energias e padrões de simetria cujo funcionamento permanece como um mistério para os cientistas tradicionais.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPRA, Fritjof. O Tao da Física: um paralelo entre a Física Moderna e o Misticismo Oriental. Editora Cultrix, 1993.

DAHLKE, Rudiger e DETHLEFSEN, Thorwald. A doença como caminho: uma visão nova da cura como ponto de mutação em que um mal se deixa

transformar em bem. Editora Cultrix, 2007.

STIBAL, Vianna. ThetaHealing: uma das mais poderosas técnicas de cura energética do mundo. Editora Madras, 2014.

Wikipedia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Crença – acessado em 06/07/2015.

Isabel Zborowski é, entre tantas outras proficiências, acupunturista.
isabel

Isabel participou de vários cursos na multiversidade entre eles o de Acupuntura Japonesa, Lightworkers, Massagem Japonesa, Conscienciologia Integral, parabéns Isabel, nossas melhores energias e votos de liberdade e amor eternos! Mário